quarta-feira, 16 de março de 2011

Shogun: a trajetória de um campeão


Quando o curitibano Maurício "Shogun" Rua subiu nos ringues do Meca World Vale Tudo, no Rio de Janeiro, para enfrentar o assustador Evangelista Cyborg, em 2003, a maioria dos espectadores duvidou que ele pudesse vencer. O jovem de apenas 22 anos não se abalou, e mostrando técnica apurada no chão e em pé, nocauteou seu adversário num combate eletrizante.

Meses depois, ainda sob a sombra do irmão Murilo Ninja e do colega de academia, o campeão Wanderlei Silva, Maurício estreava no evento japonês Pride, ainda visto com reservas pelos fãs do MMA. Após quatro nocautes, o discreto curitibano foi escalado para participar do Pride GP, em 2005, estreando contra ninguém menos que Quinton Rampage Jackson, estrela mundial do esporte. Seria uma presa fácil para o americano, imaginava a maioria dos fãs. Shogun venceu com um nocaute fulminante, em menos e cinco minutos de combate. Teria sido uma noite de sorte do brasileiro, ou uma luta sem inspiração de Rampage, muitos cravaram: Maurício não teria bala para bater Rogério Minotouro, irmão de Minutauro e destaque da Brazilian Top Team, maior rival da curitibana Chute Boxe. O baiano, com seu boxe olímpico e seu jiu-jitsu com a grife da equipe carioca, vinha de oito vitórias consecutivas, incluindo adversários renomados como Dan Henderson, Alistair Overeem e Kazushi Sakuraba. Mas, em uma luta épica, Shogun venceu dominando nas três dimensões da luta: trocação, wrestling e solo.

Veio então a noite da final do Grand Prix, com todas as atenções voltadas para o tão esperado embate entre o carioca Ricardo Arona e Wanderlei Silva, numa das semi-finais. Poucos se atentavam para o jovem de 24 anos que enfrentaria o enorme Alistair Overeem, holandês com um muay thai de primeira linha. Contrariando todas as previsões, Shogun nocauteou Overeem no primeiro round, classificando-se para a final contra Arona, que havia derrotado vencido a outra semi-final minutos antes. Àquela altura, Ricardo Arona havia conquistado um feito incrível: batera Wanderlei Silva, invicto há mais de cinco anos na categoria até 93kg. O carioca adquiria o status de imbatível, e não seria o jovem curitibano que estragaria sua festa. Pois, novamente, Maurício Shogun entrou no ring incrivelmente calmo e, com leveza e naturalidade, liquidou Arona em menos de três minutos.

O mundo, pela primeira vez, passava a dar o devido respeito a Shogun. A promessa do esporte precisou conquistar um cinturão do Pride para ser visto como um lutador no topo da categoria. E, após novas consistentes vitórias no evento japonês, o curitibano desembarcou no UFC em 2007. Recuperando-se de contusão, estreou com uma performance irregular e foi derrotado por Forrest Griffin. Precisou enfrentar cirurgias com uma longa e difícil recuperação. Retornou ao octógono em 2009, com vitória sobre o americano Mark Coleman, numa atuação que ainda não convencia de que havia recuperado sua melhor forma. Talvez por isso, Maurício voltou a ser considerado azarão quando enfrentou, ainda em 2009, o ex-campeão dos meio-pesados do UFC, Chuck Liddell, lutador de mma mais famoso de todos os tempos nos EUA. Mesmo assim, bastou um round para que o brasileiro mandasse o americano à lona, em um nocaute impressionante.

A vitória sobre Liddell garantiu a Shogun a chance de disputar o cinturão da categoria, no mesmo ano, contra o carateca e compatriota Lyoto Machida, invicto na sua carreira de quinze lutas. O mundo do esporte voltou a menosprezar o curitibano. As casas de apostas pagavam mais de quatro vezes o valor da aposta para a vitória do desafiante, enquanto a aposta em Machida pagaria 1.2. A mídia esportiva era praticamente unânime em apontar que o cinturão continuaria com o campeão. Com uma estratégia apurada, Shogun fez uma luta excelente, porém não o suficiente para convencer os jurados, que apontaram a vitória de Lyoto em três dos cinco rounds. A imprensa especializada, por sua vez, foi veemente em apontar o equívoco na decisão oficial, reconhecendo a superioridade de Shogun. A mesma opinião foi apresentada por Dana White, Presidente do UFC, que assegurou uma revanche imediata para tirar as dúvidas sobre quem merecia ser o campeão.

Teria a performance na primeira disputa de cinturão sido suficiente para afastar a desconfiança geral sobre o potencial de Shogun? Ainda não. Na revanche, as casas de apostas ainda apontavam o favoritismo de Machida, assim como a maioria da imprensa esportiva. A opinião geral é de que o carateca, desta feita, já saberia qual a estratégia de Maurício, e conseguiria anulá-la para manter o cinturão. Na nova luta, em maio de 2010, Shogun então não deixou qualquer dúvida: mandou o campeão à lona no primeiro round para tomar o cinturão dos meio-pesados do Pride.

Ao analisar esta tragetória, não será espantoso para o leitor saber que logo em sua primeira defesa de cinturão, o campeão Shogun seja considerado o azarão. O curitibano enfrentará a revelação Jon Jones, americano de 23 anos que vem encantando o público com um wrestling muito eficiente e nocautes fulminantes. Público, imprensa e casas de apostas veem em Jones um lutador mais completo, com mais vigor e técnica, pouco importando que seu cartel de vitórias não contenha nenhum adversário de peso.

A desconfiança não abala Maurício Shogun. Ele sabe que parte do prestígio que se dá a Jones atualmente é fruto do que ele próprio, Shogun, conquistou, ensinando o mundo a respeitar lutadores jovens. Hoje, detentor do cartel mais consistente em toda a história do mma, o brasileiro está focado em apenas uma coisa: lutar, mostrar novamente seu potencial, e manter o cinturão em solo brasileiro. Se passarão finalmente a lhe dar o devido reconhecimento com mais uma vitória, pouco importa. Maurício Shogun tem o respeito e a torcida dos brasileiros e de grande parte do mundo das lutas, que acreditam e sempre acreditarão neste que é indiscutivelmente um dos maiores lutadores da história do esporte.